Foto: IA
Das pragas que se insurgem contra o Parque Linear de Natal e que habitam as superfícies da natureza, umas das mais perigosas é o dióxido de enxofre produzido em ofícios que se esperam manter em segredo. Até que algum repórter os descubra. Um mês depois que o prefeito de Natal anunciou a intenção de edificar um Parque Linear de Natal em trecho do Parque das Dunas, a procuradora Marjorie Madruga disparou um ofício para o Idema sobre o qual vou me deter apenas num trecho: no muro de lamentações que lá se seguia havia uma informação valiosa: o plano de manejo do Parque, incólume desde 1989 havia sido modificado.
A matéria é do Blog do Dina. Por que um plano de manejo que funcionou por 32 anos precisou ser “blindado” com precisão geodésica logo após o anúncio de um parque linear de natal? A cronologia não mente. Em 23 de julho a ideia do parque linear de Natal foi anunciada. Em 25 de julho, publicada a portaria comunicando as mudanças no plano de manejo do parque.
Aos desavisados como eu: precisão geodésica é a bruxaria – não chamarei esse expediente político de ciência – pelo qual a partir do momento em que se anunciou um parque linear, deixou de interessar a flexibilidade do ‘mais ou menos aqui’. Era preciso amarrar tudo em pontos exatos, sem espaço para interpretação. O plano, que antes funcionava com margem de ajuste, foi blindado com coordenadas de GPS militar para virar lei de ferro. A cronologia não mente: a mudança só veio quando a disputa pelo espaço ficou grande demais para caber no ‘olhômetro’.
Há momentos na vida pública brasileira em que a coincidência se torna tão improvável que só mesmo a ingenuidade militante ou a má-fé conseguem ignorar o óbvio. O caso do Parque Linear de Natal e a súbita “modernização” do Plano de Manejo do Parque das Dunas é um desses casos. Vamos aos fatos, porque eles são teimosos.
A Cronologia que Incomoda
Em 23 de julho de 2025, o prefeito Paulinho Freire anuncia em primeira mão ao Diário do RN a criação de um parque linear de Natal na Avenida Roberto Freire. Dois dias depois, em 25 de julho, assina com o Exército a concessão de 10 hectares. Até aqui, tudo dentro da normalidade democrática: um prefeito eleito anuncia um projeto urbano em área cedida pelo Exército.
Mas eis que, coincidentemente, em 2025 – após 32 anos de vigência do mesmo plano de manejo de 1989 – os gestores do Parque das Dunas decidem que era urgentíssimo atualizar o documento. Não qualquer atualização: uma revolução técnica que transformou 113 páginas em 876 páginas. Uma ampliação de 675%!
A pergunta que não quer calar: por que um plano que funcionou tranquilamente desde 1989, passando por governos de todos os matizes ideológicos, de repente se tornou “inadequado” justamente no ano em que se anuncia o Parque Linear?
O Plano Anterior: Simplicidade que Funcionava
O Plano de Manejo de 1989, com suas modestas 113 páginas, estabelecia um zoneamento básico mas eficiente. A área onde seria implantado o Parque Linear de Natal estava classificada como Zona de Recuperação – ou seja, área já degradada que deveria ser restaurada. O próprio plano reconhecia: “área alterada pelo homem, zona provisória, que uma vez restaurada, deverá se incorporar em uma das categorias permanentes”.
Traduzindo: era uma área que precisava de intervenção para ser recuperada. Um parque linear com função de recuperação ambiental seria não apenas possível, mas desejável segundo a lógica do plano anterior.
As normas eram genéricas, os limites aproximados, as coordenadas imprecisas. Havia, como sempre deve haver em documentos técnicos sensatos, margem para interpretação e flexibilidade para adaptação às necessidades urbanas legítimas.
A Blindagem de 2025: Precisão Cirúrgica Contra a Política
Agora vejam a sofisticação do novo plano. Não se trata mais de um documento técnico: é uma fortaleza jurídica construída com precisão de engenharia militar.
741 vértices geodésicos com coordenadas UTM exatas no Sistema SIRGAS-2000. Cada metro quadrado do parque agora tem coordenadas precisas até a segunda casa decimal. Acabaram-se as “zonas cinzentas” de interpretação. Qualquer intervenção agora precisa respeitar coordenadas que foram calculadas com precisão de GPS militar.
Mas não para por aí. O novo plano exige:
- Estação Meteorológica Automática monitorando 17 parâmetros diferentes, 24 horas por dia
- Acordos de Cooperação Técnica obrigatórios com Exército, Aeronáutica e Marinha
- Integração com o Centro de Controle em Brasília, funcionando em quatro turnos
- Especificações técnicas rígidas para qualquer instalação: área gramada de 14x18m, cercado metálico, mastro de 10 metros com aterramento elétrico
Pergunto: que projeto urbano consegue atender a essas exigências? Que prefeito tem orçamento para instalar estações meteorológicas que transmitem dados em tempo real para Brasília?
A Estratégia: Transformar o Político em Técnico
A genialidade da operação está em transformar uma decisão política em uma impossibilidade técnica. Não se diz “não queremos o parque”. Diz-se: “o parque não atende às especificações técnicas do plano de manejo”.
É a mesma lógica que transforma uma decisão ideológica em “ciência”. Criam-se critérios tão específicos, tão detalhados, tão burocraticamente complexos que qualquer projeto se torna inviável na prática.
O Conselho Gestor não precisou nem se dar ao trabalho de debater o mérito do projeto. Bastou apontar para as 876 páginas e dizer: “não está conforme as especificações técnicas”. Pronto. Democracia neutralizada por tecnocracia.
O Timing Suspeito
Mas o que mais incomoda é o timing. Trinta e dois anos! O plano de 1989 atravessou governos de direita, centro e esquerda. Funcionou durante a redemocratização, o Plano Real, os governos FHC, Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro. Nunca ninguém achou que precisava de 741 coordenadas geodésicas para funcionar.
Até que, coincidentemente, no mesmo ano em que um prefeito anuncia um parque linear de Natal, descobre-se que o plano estava “desatualizado” e precisava urgentemente de uma revisão que o tornasse oito vezes maior e infinitamente mais complexo.
Se isso não é engenharia jurídica para barrar um projeto específico, então eu não entendo mais nada de política brasileira.
A Democracia Sequestrada pela Tecnocracia
O que está em jogo aqui não é apenas um parque. É o direito democrático de um prefeito eleito implementar projetos urbanos legítimos. É a soberania popular contra a ditadura dos especialistas.
Não estou defendendo que se faça qualquer coisa em área de preservação. Estou denunciando o uso instrumental da técnica para neutralizar a política. Estou questionando por que critérios que não existiam por três décadas de repente se tornaram “indispensáveis” justamente quando incomodam.
O Bosque dos Namorados funciona há décadas no mesmo parque, com o mesmo plano de 1989. Por que funcionava antes e agora seria impossível? Simples: porque o Bosque dos Namorados estava previsto no plano anterior. O Parque Linear não estava.
A Pergunta que Não Quer Calar
Se o objetivo fosse realmente proteger o meio ambiente, por que não se propôs uma revisão conjunta do projeto do Parque Linear de Natal para adequá-lo aos critérios ambientais? Por que não se buscou um meio-termo entre preservação e uso público?
A resposta é óbvia: porque o objetivo nunca foi proteger. O objetivo sempre foi impedir.
A prova está na cronologia: primeiro veio o anúncio do parque (julho), depois veio a blindagem técnica (2025). Não é coincidência. É estratégia.
A Técnica a Serviço da Política
O caso do Parque Linear de Natal é um manual de como a tecnocracia pode ser usada para neutralizar a democracia. Como transformar 113 páginas em 876 para dizer “não” sem assumir a responsabilidade política de dizer “não”.
É a vitória da burocracia sobre a representação. Do especialista sobre o eleito. Da norma técnica sobre a vontade popular.
E o mais triste: tudo isso feito em nome da “proteção ambiental”, como se a preservação da natureza fosse incompatível com o uso público democrático dos espaços urbanos.
Trinta e dois anos de um plano simples e funcional. Um ano de anúncio de parque linear de Natal. Oitocentas e setenta e seis páginas de blindagem técnica.
A cronologia não mente. E quem tem olhos para ver, que veja.
Blog do Dina
Se a ideologia cabe nesse caso, sou de Direita. Porém, é humanamente impossível alterar de 100 para 600 páginas em dois dias. Vamos ser racionais né? Um plano de manejo pode e deve ser alterado até pelo fato das necessidades de 89 não serem mais as mesmas de 2025, tudo precisa ser atualizado. Outro ponto é que essa alteração tão robusta precisa de embasamento científico, ja que se trata de um documento técnico. Repito: Não se altera em dois dias. Isso era algo que já vinha sendo feito e foi publicado. Coincidentemente, dois dias depois da publicação do parque. Simples.
O maior inimigo do RN é o próprio RN…Os Cearenses e Paraibanos agradecem e apóiam. Continuem assim irmãos potiguares!!!
Essa turma que aparece!
Petralhas não tem compromisso com desenvolvimento.