Ao falar sobre o núcleo operacional que compunha o esquema conhecido como mensalão, denunciado na Ação Penal 470, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, afirmou que José Dirceu e Marcos Valério foram os principais protagonistas do esquema criminoso apurado e comprovado nesta ação penal, agora em julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. “José Dirceu foi o mentor do esquema, enquanto Marcos Valério foi o seu principal operador”, declarou.
Para o procurador-geral, a prova não deixa dúvidas de que foi José Dirceu quem imaginou a criminosa forma de composição da base de apoio do governo executada durante os anos de 2003 e 2004, mediante o pagamento de vantagem indevida a seus integrantes. “Para executar esse plano, era obviamente indispensável reunir o dinheiro necessário para fazer frente aos acordos firmados”, disse.
Conforme explicou, na condição de líder dos núcleos operacional e financeiro da quadrilha, Marcos Valério foi a pessoa que, em razão dos vínculos que mantinha com os bancos Rural e BMG, possibilitou a entrada dos valores de que José Dirceu e seus companheiros precisavam para cumprir os ajustes feitos.
“Em apertadíssima síntese, a sistemática de ação do grupo na operacionalização dos pagamentos pode ser assim descrita: efetuados os acordos com os partidos políticos e os parlamentares, a cargo de José Genoíno e sob o firme comando de José Dirceu, cabia a Delúbio Soares transmitir a Marcos Valério os valores a serem repassados e os nomes dos respectivos beneficiários. Com a informação, Marcos Valério, valendo-se da colaboração de Simone Vasconcelos e Geiza Dias, providenciava o dinheiro e a sua entrega ao beneficiário. A entrega do dinheiro era feita em agências bancárias e, também, em quartos de hotel”, explicou Gurgel.
Segundo Gurgel, à medida que se intensificavam os acordos firmados pelo núcleo político, Marcos Valério foi ampliando o seu poder dentro do grupo. “De mero financiador do projeto ilícito de José Dirceu, tornou-se personagem influente, com poder até para negociar a formação da base aliada do governo, tornando-se homem de confiança de José Dirceu.”
Gurgel disse que, para executar com eficiência os atos que lhe cabiam, Marcos Valério contou com a indispensável colaboração dos seus sócios Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Rogério Tolentino. “É certo que, na divisão de tarefas que é própria de grupos criminosos, cabia a Cristiano Paz e a Ramon Hollerbach o exercício de atividades que, vistas dissociadas do contexto criminoso, pareciam lícitas.”
Para compreender o envolvimento de Cristiano Paz e Ramon Hollerbach no esquema ilícito objeto da ação penal, Gurgel ressaltou que Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Marcos Valério eram sócios da SMP&B Comunicação Ltda. e da Graffiti Participação Ltda. A Graffiti Participações Ltda., por sua vez, era sócia da DNA Propaganda. “Na prática, os três eram, juntamente com Marcos Valério, sócios tanto da SMP&B como da Graffiti e da DNA e geriam em conjunto as três empresas.”
De acordo com ele, perícias realizadas pelo Instituto Nacional de Criminalística comprovaram que Cristiano Paz e Ramon Hollerbach participaram ativamente de todas as fraudes contábeis realizadas nas empresas SMP&B Comunicação Ltda. e DNA Propaganda com o objetivo de ocultar o destino dos valores destinados ao esquema protagonizado por José Dirceu e seu grupo. “Cristiano Paz, por sua vez, esteve envolvido até mesmo com a etapa de realização dos saques e manipulação dos recursos que alimentaram o esquema ilícito de compra de votos.”
Ao falar sobre o depoimento de David Rodrigues Alves, policial civil do estado de Minas Gerais contratado para efetuar saques de dinheiro em espécie mediante o desconto de cheques endossados da SMP&B, Gurgel destacou que era tão intensa a movimentação de recursos que fatos como esse foram frequentes por causa das elevadas importâncias em dinheiro.
Para Gurgel, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach tinham conhecimento da atividade ilícita desenvolvida por Marcos Valério, tanto que subscreveram, juntamente com Marcos Valério, os contratos de empréstimos simulados firmados com o Banco Rural e com o BMG. Conforme explicou, esses empréstimos tinham por objetivo formal o financiamento do capital de giro das empresas. “No entanto, parte dos valores foram apropriados pelos acusados a título de pro labore ou de distribuição de dividendos. É no mínimo contraditório a empresa contrair um empréstimo para financiamento do seu capital de giro e usar o valor para distribuir lucros aos sócios.”
Segundo Gurgel, o que aconteceu de fato e está provado por Laudo Pericial do Instituto Nacional de Criminalística, é que o valor apropriado constituiu remuneração paga aos acusados pela atividade ilícita que desenvolviam. “Como os empréstimos representavam uma das etapas da lavagem dos recursos, a retirada de parte dos valores era justamente a parcial remuneração dos responsáveis pelo delito perpetrado. E tanto é assim, que até mesmo Rogério Tolentino, que não era sócio das empresas mutuárias, recebeu também sua parte, retirada dos valores obtidos com os empréstimos.”
O procurador-geral disse também que Rogério Tolentino, muito embora não figurasse como sócio das empresas, teve destacada atuação no esquema ilícito: a principal prova da sua participação está no episódio do desvio de R$ 73.851.000,00 de recursos do Banco do Brasil. “A empresa Rogério Lanza Tolentino & Associados Ltda. foi responsável por uma complexa operação de lavagem para ocultar parte do valor desviado – R$ 10 milhões – utilizados para financiar o esquema de cooptação política”, destacou.
“Em verdade, as retiradas sistemáticas comprovaram, o que já se sabia, que a estrutura empresarial montada por Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Rogério Tolentino não passava de um instrumento para a consumação dos crimes. A condição de sócio das empresas era apenas um aspecto formal, de fachada. Na prática, todos indistintamente geriam as empresas, do mesmo modo em que, também juntos, geriam o esquema ilícito de corrupção, desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro”, complementou Gurgel.
Simone Vasconcelos e Geiza Dias, responsáveis pela administração financeira da empresa, executavam materialmente o processo de entrega das propinas, continuou Gurgel. Enquanto Gerente Financeira da SMP&B, Geiza era a responsável pelo encaminhamento ao Banco Rural dos nomes dos reais destinatários dos valores distribuídos. Cabia a ela, também, encaminhar, principalmente por correio eletrônico, a qualificação dos beneficiários dos valores que alimentavam o esquema ilícito de compra de votos. E ela tinha papel de fundamental importância no envio de recursos para a conta mantida no exterior por Duda Mendonça e Zilmar Fernandes.
Segundo Gurgel, Simone Vasconcelos era a diretora administrativo financeira da SMP&B Comunicação Ltda e cabia a ela a função de entrar em contato com os destinatários dos valores, informando que o dinheiro já estava disponível e orientando sobre o local e a forma de recebimento. A acusada manipulava valores tão elevados que, em certa ocasião teve que contratar um carro forte para o transporte dos recursos. Em seu depoimento, ela disse que que “tinha verdadeiro pavor em sair da agência bancária portando grandes quantias em dinheiro e, certa vez, solicitou que um carro forte fosse levar 650 mil reais para o prédio da Confederação Nacional do Comércio, local onde funcionava a filial da SMP&B em Brasília/DF”.
Fonte: Sec. de Comunicação da Procuradoria Geral da República

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