Clima

Cientistas dizem que gás invisível pode selar nosso destino climático

Foto: CNN

Reduzir as emissões de carbono é fundamental para acabar com a crise climática. Mas, pela primeira vez, o relatório da ONU sobre mudanças climáticas enfatizou a necessidade de controlar um elemento mais traiçoeiro: o metano, um gás invisível e inodoro, com poder de aquecimento mais de 80 vezes maior do que o dióxido de carbono no curto prazo.

De acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas (IPCC), a concentração de metano na atmosfera é maior agora do que nos últimos 800 mil anos.

Com a Terra se aproximando do limite de 1,5 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais, cientistas dizem que as emissões de metano precisam ser rapidamente cortadas. Charles Koven, principal autor do relatório do IPCC, disse que isso se deve ao grande poder de aquecimento do metano.

“Cortar o metano é a maneira mais rápida de mitigar algumas das mudanças climáticas que já estamos vendo no curto prazo”, disse Koven à CNN. “Se reduzíssemos as emissões de metano, isso compensaria uma dessas fontes de aquecimento”.

Se o mundo parasse de emitir dióxido de carbono amanhã, comentou Koven, as temperaturas globais levariam anos para começar a baixar, por causa do tempo que o gás permanece na atmosfera. Reduzir o metano é a estratégia mais fácil para mudar a trajetória da temperatura no mundo nos próximos 10 anos, acrescentou.

O metano, principal componente do gás natural que usamos em fogões e no aquecimento de casas, por exemplo, pode ser produzido na natureza por erupções de vulcões e decomposição de matéria vegetal. Mas ele também é lançado na atmosfera em quantidades muito maiores por aterros, pela pecuária e a indústria de petróleo e gás.

O gás natural foi chamado de “combustível-ponte”, algo que faria a transição dos EUA para a energia renovável, pois é mais eficiente que o carvão e emite menos CO2 quando queimado. Importante para a indústria, o gás natural é abundante em todo o mundo, e sua extração é mais barata.

Mas os proponentes desse novo gás “mais limpo” não perceberam uma ameaça perigosa: que ele poderia vazar para a atmosfera sem ser queimado e causar um aquecimento significativo.

O metano pode vazar de poços de petróleo e gás natural, dutos de gás natural e dos equipamentos usados no processamento. De acordo com dados da Administração de Informações sobre Energia dos Estados Unidos, os EUA têm milhares de poços ativos de gás natural, milhões de poços abandonados de petróleo e gás, cerca de três milhões de quilômetros de dutos de gás natural e diversas refinarias que processam o gás.

Um em cada três norte-americanos vive em um condado com operações de petróleo e gás, o que representa riscos para o clima e para a saúde pública, de acordo com um relatório do Fundo de Defesa Ambiental dos EUA.

Até recentemente, era difícil rastrear a localização e a magnitude dos vazamentos de metano. Agora, câmeras infravermelhas e satélites podem estimar as emissões de metano em todo o mundo, dando aos cientistas e reguladores uma visão do que está sendo liberado das instalações.

Climatologistas da NASA e da Agência de Administração Oceânica e Atmosférica dos EUA disseram anteriormente à CNN que as mudanças danosas no sistema climático só vão se intensificar, a menos que as pessoas parem de usar combustíveis que queimam e emitem gases de efeito estufa, como o metano.

“No caso do dióxido de carbono, sempre soubemos o papel das usinas elétricas, chaminés e coisas do gênero, mas no caso do metano, até recentemente não entendíamos quanta influência um pequeno número de grandes fontes realmente tinha”, disse à CNN Robert Jackson, professor de ciência ambiental da Universidade de Stanford. “Não entendíamos o tamanho do escopo e a importância dos superemissores para a redução das emissões”.

A última avaliação do IPCC destaca que os cientistas agora têm um melhor entendimento de quanto metano está sendo liberado por atividades humanas, como a agricultura e a indústria de combustíveis fósseis, e quanto isso contribui para a crise climática.

As fontes de emissão de metano variam por região. Na América do Norte, a maioria – 41% do total de emissões de metano – vem da produção de petróleo e gás, seguida pela pecuária, com 28%. Na China, a mineração de carvão é o maior gerador de metano, contribuindo com 43% de suas emissões totais.

Embora a agricultura seja uma importante fonte de metano, Jackson comentou que as emissões da agricultura e da produção de alimentos seriam mais difíceis de controlar.

“Existem apenas algumas coisas que podemos fazer com a pecuária”, afirmou Jackson. “Podemos pedir que as pessoas parem de comer carne, ou podemos tentar incluir aditivos na ração do gado para mudar os microorganismos na química de seus intestinos. Mas isso não é fácil de fazer em bilhões de rebanhos no mundo todo”.

A Agência Internacional de Energia estima que a indústria mundial de petróleo e gás pode reduzir o metano em 75% usando a tecnologia já disponível. A organização também estima que 40% das emissões poderiam ser reduzidas sem custo adicional, já que o gás natural captado poderia ser comercializado.

Ativistas do clima como Lisa DeVille, membro da nação Mandan, Hidatsa e Arikara (uma nação nativa norte-americana, também conhecida como as três tribos afiliadas), estão pedindo aos legisladores que reduzam rigorosamente o metano. O campo de petróleo de Bakken, no estado da Dakota do Norte, circunda a Reserva Indígena Fort Berthold, onde DeVille vive, e possui quase mil poços de petróleo e gás. Em 2016, cientistas descobriram que havia o vazamento de 275 mil toneladas de metano por ano no local.

“Isso significa que a terra que faz parte da minha identidade como mulher indígena foi transformada em uma zona industrial poluída”, disse DeVille. “Isso é inaceitável”.

Como cofundadora do movimento Protetores dos Direitos da Água e da Terra de Fort Berthold, DeVille está enfrentando as regulamentações ambientais de frente. Em 2018, a organização processou o Bureau of Land Management, o escritório de gestão de terras públicas dos Estados Unidos, durante a gestão Trump por reverter uma importante lei de prevenção de resíduos de metano.

As temperaturas globais estão agora 1,1 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais, de acordo com o relatório, e o planeta já está vendo o impacto na forma de incêndios, inundações, secas e ondas de calor mortais.

O relatório do IPCC deixa claro que cortar as emissões de metano é a chave para impedir que o planeta atinja um aumento de 1,5 grau Celsius. Cientistas dizem que os líderes mundiais precisam agir imediatamente para combater todas as emissões de gases do efeito estufa, e não apenas o dióxido de carbono.

Rick Duke, diretor sênior e assistente da Casa Branca para John Kerry, o enviado especial do presidente Biden para o clima, disse à CNN em uma coletiva de imprensa que reduzir o metano e os vazamentos do gás é uma prioridade para o governo Biden.

“Já houve um esforço incrível nos bastidores para nos prepararmos para um movimento mais rápido e abrangente para cortar o metano internamente, ao mesmo tempo em que estamos tratando disso como um imperativo diplomático”, afirmou Duke.

A pressão já está aumentando. Em junho, DeVille discutiu questões tribais, especialmente em termos de redução de emissões de metano e da transição para uma energia limpa de forma rápida e equitativa, com o gestor da Agência de Proteção Ambiental, Michael Regan.

“O que fizermos nos próximos anos definirá o tipo de mundo que deixaremos para nossos filhos”, disse DeVille, que agora busca se reunir com a secretária do Interior, Deb Haaland, para discutir questões semelhantes. “Devemos fazer uma transição rápida para a energia limpa, cortar a poluição de carbono por combustíveis fósseis e os vazamentos de metano”.

Correção: uma versão anterior desta reportagem subestimava a contribuição de metano por indústria na América do Norte e na China. Esta matéria foi atualizada.

CNN Brasil

Opinião dos leitores

  1. São os gazes que a Governadora e alguns secretários estão soltando depous da abertura da CPI pela assembleia legislativa do RN.

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