Educação

Quase 300 milhões de estudantes estão sem aula por conta do novo coronavírus, diz ONU

Foto: CIRO DE LUCA / REUTERS

Um total de 290,5 milhões de estudantes ao redor do mundo vão passar semanas em casa a partir desta quinta-feira, quando autoridades da Itália fecharam escolas em uma tentativa de conter a proliferação do novo coronavírus. Pelo menos 22 países espalhados por três continentes adotaram medidas similares em escala nacional ou local. A informação foi divulgada pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

O coronavírus já atingiu cerca de 90 países, infectando mais de 95 mil pessoas e causando a morte de mais de 3.200.

A Itália fechou todas as escolas e universidades nesta quinta-feira até ao menos 15 de março, encorajando aulas online, à medida que tenta desacelerar a taxa de contágio no epicentro europeu. Outros paises duramente afetados pela Covid-19, como Irã, Coreia do Sul e Japão, adotaram medidas similares. Nos Estados Unidos, escolas foram fechadas em algumas cidades e distritos dos estados de Washington e Nova York.

— A escala e a velocidade globais da atual interrupção educacional são incomparáveis e, se prolongadas, podem ameaçar o direito à educação — disse Audrey Azoulay, diretora-geral da Unesco em Paris.

Em um sinal da rapidez com que o vírus se espalhou, a China, onde se originou o surto de coronavírus, era há duas semanas o único país em que o fechamento das escolas era obrigatório. Outros nove países implementaram fechamentos escolares locais, de acordo com a agência. Inicialmente, o fechamento de escolas esteve limitado ao território chinês, o mais afetado pela Covid-19.

Em Los Angeles, nos EUA, as autoridades declararam estado de emergência na última quarta-feira e orientaram pais a se prepararem para o eventual fechamento de escolas. A cidade, localizada no estado da Califórnia, é o segundo mairo distrito escolar no país. O estado de Washington, também na Costa Oeste americana, também fechou escolas, assim como o de Nova York, no lado oposto do país.

Especialistas afirmam que a escala de alunos sem aula tem poucos paralelos na história moderna. Os reflexos da interrupção de aulas por dias, semanas ou até mesmo meses podem ser expressivos para os estudantes e para a própria sociedade.

Em alguns países, alunos mais velhos perderam aulas essenciais para exames de admissão para as universidades, enquanto os mais novos encontrarão dificuldades com o raciocínio matemático e a leitura. Os pais, por sua vez, têm aumentado despesas e tentado se equilibrar entre cuidar de seus filhos e o trabalho, além de encontrarem dificuldades na busca por babás. Em alguns países, há casos de crianças que foram realocadas pelos responsáveis para áreas não afetadas pelo novo coronavírus.

— Elas sempre me perguntam ‘quando poderemos sair para brincar? Quando poderemos ir à escola?’ — relata Gao Mengxian, uma segurança particular com duas filhas em Hong Kong, onde escolas estão fechadas desde janeiro.

Gao, de 48 anos, parou de trabalhar para cuidar das filhas, que têm 8 e 10 anos cada. Ela têm se esforçado para reduzir as despesas domésticas e se aventura a sair apenas uma vez pro semana. A segurança passa a maior parte do tempo ajudando as duas meninas em tarefas da escola disponibilizadas na internet, ferramentas que as deixa confusa e as filhas, frustradas.

— Não tenho dados a respeito, mas não me recordo de qualquer ocasião tem tempos modernos onde economias avançadas fecharam escolas nacionalmente por períodos prolongados de tempo — disse ao New York Times Jacob Kirkegaard, pesquisador sênior do Instituto Peterson para Economia Internacional em Washington (EUA).

Mães sofrem impacto

Governos ao redor do mundo estão tentando ajudar a mitigar os impactos. O Japão ofereceu às companhias privadas subsídios para compensar o custo das folgas dos pais de crianças que não podem mais ir à escola. A França, por sua vez, prometeu 14 dias de licença remunerada para aqueles com crianças em necessidade de isolamento e não têm alternativas disponíveis. Na Itália, o governo estuda vouchers para babás e licenças parentais extraordinárias.

Julia Bossard, mãe de duas crianças na França, afirma que precisou repensar toda a sua rotina desde que a escola de seu filho mais velho foi fechada por duas semanas. Os dias, agora, consistem em ajudá-los com o dever de casa na internet e vasculhar supermercados por produtos que estão desaparecendo das prateleiras, como macarrão, arroz e comida enlatada.

Os efeitos das interrupções nas aulas têm caído sobre os ombros das mulheres, particularmente. Regiões duramente afetadas pelo novo coronavírus estão com falta de babás. Lee Seong-yeon, gerente de informações de saúde em um hospital de Seul, na Coreia do Sul, sai do trabalho mais cedo todos os dias para conseguir cozinhar para o filho de 11 anos.

— Eu saio quando todos ainda estão em suas mesas. Eu sei que por conta disso jamais serei reconhecida pelo meu trabalho na empresa — lamenta. — Eu acho que teria que abandonar o serviço se meu filho fosse mais novo. Eu não teria como deixá-lo em casa.

Seu marido também trabalha em um hospital e a rotina de ambos não permite que folgas ou home office para cuidar do menino, que passa a semana em casa comendo lanches e refeições preparadas previamente. Em Atenas, a corretora Anastasia Moschos, de 47 anos, teme que a escola do filho volte a ser fechada. Ela é mãe solteira e não tem com quem deixar o filho. Por sorte, quando a instituição fechou as portas preventivamente por uma semana, o pai da criança estava visitando a cidade.

— Há a presunção de que sempre há alguém para cuidar (das crianças). Esse não é o meu caso. Sou uma mãe solteira e não tenho quem ajude em casa — afirma Anastasia.

Cristina Tagliablue, uma empreendedora que vive em Milão, o epicentro da epidemia de Covid-19 na Itália, se mudou recentemente para Roma, onde mantém uma casa, com seu filho de dois anos. No entanto, nenhuma creche aceitou matricular a criança por conta da residência prévia em uma região afetada pelo novo coronavírus. Além disso, encontra dificuldades em encontrar babás.

Desde então, ela precisou recusar diversas propostas de trabalho.

— É correta a medida de fechar escolas, mas isso tem um custo. O governo poderia ter feito algo para as mães. Nós (indiretamente) também estamos em quarentena — diz a empresária.

Problemas com tecnologia

As tarefas online, propostas por diferentes governos, trazem desafios. Problemas tecnológicos e distrações inevitáveis são problemas para crianças e adolescentes. Thira Pang, de 17 anos, tem se atrasado frequentemente para as aulas virtuais por conta da conexão de internet lenta. Ela tenta, agora, acessar o sistema com 15 minutos de antecedência.

— É uma questão de sorte conseguir se conectar ao sistema — relata a aluna do ensino médio.

Publicações em redes sociais da China mostram professores e alunos no teto de escolas procurando por um sinal mais intenso de internet ou mesmo caminhando pelos arredores de escolas com o mesmo objetivo. No Japão, onde o ano escolar costuma terminar em março, muitas escolas estão restringindo as cerimônias de graduação a professores e alunos. É o caso de Satoko Morita, moradora de Akita, no Norte do Japão, que não pôde assistir ao evento de sua filha.

— Minha filha me perguntou qual era o sentido de participar e discursar em uma cerimônia de formatura sem a presença dos pais — relatou ela.

Avós que tentam compensar a ausência de pais que trabalham também encontram problemas na familiaridade com os dispositivos eletrônicos.

— Eles não têm como supervisionar o aprendizados das crianças que, ao invés de acompanharem, desenvolvem hábitos ruins, como não dar total atenção ao tempo de estudo — relata Ruby Tan, processora de Congqing, cidade no Sudoeste da China.

O Globo

 

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