Política

Dilma diz que não haverá "volta, Lula" porque ex-presidente "não saiu"

O encontro da presidente Dilma Rousseff com a Folha, na sexta, no Palácio do Planalto, começou tenso. “Minha querida, você tem que desligar o ar-condicionado”, dizia ela a uma assessora.

Com febre e faringite, medicada com antibiótico, corticóide e Tylenol, e com “o estômago lascado”, ela estava também rouca. Em pouco tempo, relaxou. E passou quase três horas falando sobre manifestações, inflação, PIB e a possibilidade de Lula ser candidato a presidente. Leia abaixo os principais trechos:

Folha – As manifestações deixaram jornalistas, sociólogos e governantes perplexos. E a senhora, ficou espantada?

Dilma Rousseff – No discurso que fiz na comemoração dos dez anos do PT, em SP [em maio], eu já dizia que ninguém, ninguém, quando conquista direitos, quer voltar para trás. Democracia gera desejo de mais democracia. Inclusão social exige mais inclusão. Quando a gente, nesses dez anos [de governo do PT], cria condições para milhões de brasileiros ascenderem, eles vão exigir mais. Tivemos uma inclusão quantitativa. Esta aceleração não se deu na qualidade dos serviços públicos. Agora temos de responder também aceleradamente a essas questões.

Mas a senhora não ficou assustada com os protestos?
Não. Como as coisas aconteceram de forma muito rápida, eu acho que todo mundo teve inicialmente uma reação emocional muito forte com a violência [policial], principalmente com a imagem daquela jornalista da Folha [Giuliana Vallone] com o olho furado [por uma bala de borracha]. Foi chocante. Eu tenho neurose com olho. Já aguentei várias coisas na vida. Não sei se aguentaria a cegueira.

Se não fosse presidente, teria ido numa passeata?
Com 65 anos, eu não iria [risos]. Fui a muita passeata, até os 30, 40 anos. Depois disso, você olha o mundo de outro jeito. Sabe que manifestações são muito importantes, mas cada um dá a sua contribuição onde é mais capaz.

O prefeito Fernando Haddad diz que, conhecendo o perfil conservador do Brasil, muitos se preocupam com o rumo que tudo pode tomar.
Eu não acho que o Brasil tem perfil conservador. O povo é lúcido e faz as mudanças de forma constante e cautelosa. Tem um lado de avanço e um lado de conservação. Já me deram o seguinte exemplo: é como um elefante, que vai levantando uma perna de cada vez [risos]. Mas é uma pernona que vai e “poing”, coloca lá na frente. Aí levanta a outra. Não galopa como um cavalo. Aí uma pessoa disse: “É, mas tem hora em que ele vira um urso bailarino”. Você pode achar que contém a mudança em limites conservadores. Não é verdade. Tem hora em que o povo brasileiro aposta. E aposta pesado.

A senhora teve uma queda grande nas pesquisas.
Não comento pesquisa. Nem quando sobe nem quando desce [puxa a pálpebra inferior com o dedo]. Eu presto atenção. E sei perfeitamente que tudo o que sobe desce, e tudo o que desce sobe.

Mas isso fez ressurgir o movimento “Volta, Lula” em 2014.
Querida, olha, vou te falar uma coisa: eu e o Lula somos indissociáveis. Então esse tipo de coisa, entre nós, não gruda, não cola. Agora, falar volta Lula e tal… Eu acho que o Lula não vai voltar porque ele não foi. Ele não saiu. Ele disse outro dia: “Vou morrer fazendo política. Podem fazer o que quiser. Vou estar velhinho e fazendo política”.

Para a Presidência ele não volta nunca mais?
Isso eu não sei, querida. Isso eu não sei.

Ao menos não em 2014.
Esses problemas de sucessão, eu não discuto. Quem não é presidente é que tem que ficar discutindo isso. Agora, eu sou presidente, vou discutir? Eu, não.

Mas o Lula lançou a senhora.
Ele pode lançar, uai.

O fato de usarem o Lula para criticá-la não a incomoda?
Querida, não me incomoda nem um pouquinho. Eu tenho uma relação com o Lula que tá por cima de todas essas pessoas. Não passa por elas, entendeu? Eu tô misturada com o governo dele total. Nós ficamos juntos todos os santos dias, do dia 21 de junho de 2005 [quando ela assumiu a Casa Civil] até ele sair do governo. Temos uma relação de compreensão imediata sobre uma porção de coisas.

Mas ele teria criticado suas reações às manifestações.
Minha querida, ele vivia me criticando. Isso não é novo [risos]. E eu criticava ele. Quer dizer, ele era presidente. Eu não criticava. Eu me queixava, lamentava [risos].

Como a senhora vê um empresário como Emílio Odebrecht falar que quer que o Lula volte com Eduardo Campos de vice?
Uai, ótimo para ele. Vivemos numa democracia. Se ele disse isso, é porque ele quer isso.

MÔNICA BÉRGAMO (Folha)

Opinião dos leitores

  1. Para o "camarada" João MS, que está aqui, lá embaixo. Vou colocar só mais este comentário, pois vou ter que sair, tenho mais o que fazer. Ademais, tenho uma gata maravilhosa me esperando. com um papo mais leve e mais interessante. Seu comentário não diz coisa com coisa, pois não faz referência nenhuma à "genial" entrevista da sua madrinha Dilma. Defendeu acusando. A luta armada está aí, na História, inclusive com assalto a banco e tudo o mais, como você deve saber. Sou contra a tortura e o Brasil precisa conhecer seus cadáveres, inclusive os insepultos. Isso é uma parte da História e isso tem que ser respeitado. O mundo já não é mais o mesmo, João, desde Woodstock, a pílula e a camisinha (estou só dando uma geral, tenho pressa). Não são os grandes homens que se inscrevem na História, a História é quem os inscreve, entendeu? Com todo o respeito e reconhecimento aos que deram alguma coisa por este país (agora tem gente tirando), me nego a certos papos mofados, borrifados de utopias e rancor. Isso é com uma parte da galera da USP. Outro lugar bacana, João, onde essas coisas rancorosas e carcomidas permeiam é a revista Caros Amigos. Recomendo. Você pede respeito às ações do seu tempo, mas, pelo visto, não respeita as ações de hoje. Tudo bem, João, chega uma hora que a gente tem que arriar as armas e passar o bastão. E para finalizar: não fomos nós que rasgamos a cartilha ideológica do PT. Você sabe quem foi.

  2. O João, aí embaixo, falou e não disse nada. Não explicou nada. Li e não saí com nada.
    "Ditadura…", "Décadas de 60/70…" Torturava e mata…" Deve ser um retardatário. Tá cheio. Tá assim, ó! O PT, então!…

  3. Parodiando Romário, "Dilma calada é uma poeta". Veja você, meu caro leitor, minha cara leitora, você acabou ler os "principais trechos" de uma entrevista feita com a presidente de um dos maiores países do mundo, feita por um dos maiores jornais do mundo, também. Se o principal é isso aí, imagine o resto. Tem pérolas como "volta para trás", "democracia gera desejo de mais democracia" – existe democracia pela metade? E de só até 70%? -, e que a inclusão social gerou mais desejo de mais inclusão. É uma poeta! Perguntada se ficou chocada com as movimentações, transferiu sua "chocação" para a agressão sofrida pela repórter da Folha. De fato, não ficou chocada, ficou atônita, zonza diante da televisão, segundo Jaques Wagner, lá da Bahia. Fato é, meu nobre editor do BG, que tudo ficou velho e bolorento, como já havia dito aqui: políticos, discurso, trejeitos marqueteiros, maneirismos verbais, cacoetes e tudo o mais. Depois desse mais de 500 anos, já era hora de se construir uma nova nação. Pode ser meio quixotesca essa minha fé, mas que a galera está com vontade, isso está.

    1. Os velhos de hoje foram os jovens da década de 60/70, quando a ditadura torturava e matava neste País. Dizer que o Brasil agora acordou, que "depois desse mais de 500 anos, já era hora de se construir uma nova nação… que a galera está com vontade, isso está" é desconhecer a nossa história. Seria melhor seguir os conselhos de Romário.

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Política

Dilma promete rever US$ 900 mi em dívidas de países africanos

A presidente Dilma Rousseff fez dois agrados neste sábado aos líderes da União Africana, o clube de presidentes do continente que se reuniram para celebrar 50 anos do organismo em Adis Abeba, na Etiópia.

Prometeu perdoar ou reestruturar quase US$ 900 milhões em dívidas de 12 países africanos com o Brasil e anunciou o fortalecimento da Agência Brasileira de Cooperação, que passará a coordenar as estratégias de comércio e investimento para a África.

Ela participou como convidada do evento e deveria fazer um discurso grandioso, mas foi prejudicada pela falta de organização.

Foi chamada ao palco 1h30 após o horário previsto, em meio a um apagão. “Eu não vou lá!”, desabafou, defrontada com a escuridão e o plenário esvaziado, segundo captou uma câmera de TV.
Mudou de ideia e acabou lendo um discurso genérico, em português sem tradução, seguido com desinteresse por menos de 100 pessoas, a maioria jornalistas.

Antes, ela havia detalhado os dois agrados que fez aos integrantes da União Africana –presidentes eleitos, ditadores e alguns procurados por crimes de guerra.

O objetivo, com o perdão da dívida, é dar condição jurídica para que o governo financie empresas brasileiras que queiram participar de projetos na África. Já a ABC ganhará a função de coordenação de todas as ações de assistência e comércio junto a países africanos e latino-americanos.

Fundada em 1963, a União Africana participou de esforços de paz em países como Sudão e Somália, mas tem falhado em assegurar a estabilidade do continente.

Na plateia, neste sábado, havia líderes como Robert Mugabe, do Zimbábue (há 33 anos no poder), Omar al-Bashir, do Sudão, e Uhuru Kenyatta, de Quênia –esses dois últimos indiciados por promover violência política pelo Tribunal Penal Internacional.

Kenyatta ainda participou de uma reunião bilateral com a presidente Dilma, pela manhã.

Da Folha

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