Permitir o uso de drogas é uma forma eficaz de combater o encarceramento em massa e a superlotação das cadeias? Um estudo sobre 36 países que adotaram leis mais tolerantes com usuários de drogas revela que, em 22 deles (ou 61% do total), o número de pessoas presas aumentou após a adoção dessas políticas.
O levantamento “Política de Drogas e Encarceramento” foi realizado pelo ITTC (Instituto Trabalho, Terra e Cidadania), uma organização de direitos humanos que presta assistência a populações com problemas na Justiça. O estudo será lançado nesta quinta-feira (7), em São Paulo, em forma de infográfico.
Foram avaliados 36 países que despenalizaram, descriminalizaram ou legalizaram o uso de drogas, sobretudo a maconha.
Despenalizar é quando o consumo continua sendo crime, mas o usuário não pode sofrer uma pena restritiva — é o caso do Brasil. Descriminalizar é quando o consumo deixa de ser crime — exatamente o julgamento que está no STF, paralisado desde setembro. E legalizar é o que aconteceu no Uruguai e em alguns Estados norte-americanos, em que o consumo é permitido, mas segue determinadas regras.
Dos 36 países avaliados, 21 são europeus e 15 americanos: Argentina, Bélgica, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Holanda, Honduras, Hungria, Irlanda, Itália, Luxemburgo, México, Paraguai, Peru, Portugal, Reino Unido, Venezuela, Alemanha, Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, República Tcheca, Romênia, Ucrânia, Costa Rica, Croácia, EUA, Jamaica e Uruguai.
Dos 15 países americanos, 11 tiveram aumento do encarceramento após adotarem política tolerante com o usuário: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Honduras, México, Paraguai, Peru e Venezuela.
Já dos 21 europeus, 11 viram aumentar o número de presos: Bélgica, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Portugal e Reino Unido.
Costa Rica, Croácia, EUA, Jamaica e Uruguai não tiveram o encarceramento analisado porque as mudanças em suas legislações são recentes.
De acordo com uma das coordenadoras do levantamento, a internacionalista Lucia Sestokas, tolerar o consumo de drogas não foi o que provocou o aumento do número de presos.
O que acontece, diz ela, é que essa política lida somente com um personagem da temática, o usuário, sendo “insuficiente” para evitar que mais pessoas sejam presas.
— As pessoas que estão sendo presas entram para o tráfico como um trabalho, entram para sanar um problema econômico pontual ou crônico, de geração e complementação de renda.
Dessa forma, diz Lucia, as políticas de drogas precisam ser ampliadas e estarem atreladas “a políticas sociais, econômicas e de geração de renda”.
Em Portugal, por exemplo, a descriminalização do uso ocorreu em 2001, mas o aumento do encarceramento só aconteceu em 2008 e 2009, em razão da crise econômica.
A Lei de Drogas do Brasil vai completar dez anos em 2016. De lá para cá, a lei foi responsável por um aumento na população carcerária brasileira, que saltou de 400 mil para mais de 600 mil no final de 2014, segundo dados do Depen (Departamento Penitenciário Nacional), do Ministério da Justiça.
A lei está prestes a ser alterada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que está analisando o Recurso Extraordinário 635.659, que pode levar à descriminalização do usuário.
Em setembro passado, os ministros Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso votaram pela descriminalização do porte de maconha. O julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Teori Zavascki.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
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